No ano de 2012 durante uma maratona, o maratonista Fernandes Anaia segundo lugar na prova, ao se aproximar da linha de chegada observou que o queniano Abel Mutai se distraiu e desacelerou o ritmo entendendo que já havia cruzado a linha de chegada.
O espanhol poderia facilmente o ter ultrapassado e conquistado o primeiro lugar, mas não o fez; Pelo contrário, alertou o queniano e o empurrou até a vitória. O jornalista não entendeu o gesto do maratonista e perguntou: porque você fez aquilo? Ele não entendeu e perguntou: aquilo o que? Então o jornalista disse: você o deixou ganhar. O jovem insiste: eu não deixei, ele ia ganhar. O jornalista insistiu dizendo: mas ele estava distraído, e o jovem respondeu assim. “Então, se eu ganhasse desse modo qual seria o mérito da minha vitória”? O que eu ia pensar de mim mesmo subindo ao pódio no lugar do número um, qual seria a honra da minha vitória, o que eu ia falar para minha mãe?
Vejamos este acontecimento à luz das considerações do Professor Mário Sergio Cortela.
“Que bela lição de honradez e de reconhecimento da autoridade daquela que lhe ensinara os verdadeiros princípios morais, sociais e éticos”. “A mãe, a autoridade, aquela que não pode ser envergonhada”.
O jornalista habituado a levar a notícia, acompanhar os mais diversos eventos, ele é que não é capaz de entender tamanho gesto de grandeza. É compreensível, o jornalista pode ter uma boa mãe, mas está habituado ver a lei da vantagem prevalecer a qualquer preço. Mas para o Fernandes Anaia aquele foi e será um comportamento normal. Agiu com a consciência e decidiu fazer o que é correto.
A consciência do maratonista simplesmente o faz pensar e decidir pelo correto, com base nos princípios éticos que recebeu na sua criação e no desporto.
Não sou merecedor do primeiro lugar no pódio, me contento com o merecido segundo lugar, aquele que conquistei por mérito, não quero me envergonhar e nem envergonhar a minha mãe. Sabe por quê? Se você envergonhar a sua mãe, seja ela quem for ou quem foi, se aquela que te deu a luz, que te trouxe ao mundo se ela ficar com vergonha de ter te parido é porque você não presta.
Não presta pra quê? Pra conviver junto, para ser gestor público ou privado, pra ser professor, professora, pra ser marido, pra ser esposo, esposa, pra ser amigo, amiga, pra ser pai pra ser mãe. (Professor Mário Sergio em uma entrevista na televisão).
“É porque você não presta”. Palavras fortes demais para uma pessoa da envergadura do maratonista aceitar para si, estas palavras não fazem parte do cotidiano de quem foi criado, educado e orientado a aceitar só aquilo que lhe é merecido, não subir ao pódio no lugar de outro e quando subir ocupar o lugar que tão somente é seu por direito, pela conquista decente, sem trapacear, olhando para frente e reconhecendo que o lugar do oponente a ele pertence.
O apostolo Paulo, na carta aos corintos 1: 6 a 12 escreve: “Tudo me é permitido, mas nem tudo me convém.” Parece contraditório mas não é. Para entender porque não é contraditório não é necessário fazer grande esforço, basta olharmos o comportamento social dos nossos dias onde tem muita gente fazendo tudo o que lhes é permitido fazer.
Fazem o que querem fazer por conta do livre arbítrio, ultrapassam os limites de liberdade, causam sofrimentos das mais variadas naturezas para terceiros sem se preocupar se mais à frente tiver que responder pelo que fez ou pela forma como faz pouco se importando de não fazer aquilo que não é conveniente fazer.
Muitos fazem tudo porque lhes é permitido fazer sem se importar de não fazer aquilo que não convém fazer, sobem ao pódio no lugar dos verdadeiros merecedores, vivem a teoria do rolo compressor sem se importar com quem esteja a cima, ao lado ou a baixo delas. Acreditam serem donas exclusivas das estradas ruas e avenidas, não aceitando dividir espaços pensam que as outras pessoas merecem apenas os caminhos estreitos e varadouros, ou seja, as migalhas as sobras, não estão dispostas a dividir nada com ninguém. Gente pobre de espirito vitimada pela prisão da alma. O egoísmo.
O egoísmo é uma prisão de segurança máxima de onde o prisioneiro não sai não se liberta e não consegue fugir porque ele, o prisioneiro é seu próprio carcereiro. Equivocado, o egoísta considera a vida como sendo uma maratona. Isolado no seu mundo particular o egoísta é incapaz de ver que a vida ao invés de ser uma maratona é uma grande oportunidade que a Natureza dá ao ser humano para construir e viver a felicidade.
O homem que busca construir e viver a felicidade jamais será prisioneiro de um sistema, do egoísmo ou de si mesmo. Ao contrario do egoísta, se comporta como fez o Fernandes Anaia.
Pelo que parece, para o Fernandes Anaia egoísmo é uma palavra sem chance de ser concretizada em ação, não faz parte do seu cotidiano e é bem possível que pela sua criação exemplar nunca tenha feito parte de sua vida.
Naquela oportunidade o maratonista Fernandes Anaia mostrou que para construir e viver a felicidade é preciso renuncia, respeito e lealdade. Mostrou sobre tudo que a personagem dele reúne as qualidades de uma pessoa que presta pra conviver junto, para ser gestor público ou privado, pra ser professor, pra ser marido, pra ser amigo, pra ser pai.
Quando o Maratonista Fernandes Anaia em nome da ética e do desporto renunciou o primeiro lugar no pódio com certeza estava dizendo para o Mundo: eu sou um cidadão que presta! Deu o exemplo de como agem as pessoas do bem e que constrói a paz.
Pessoa dessa grandeza auxilia seus oponentes a chegarem aos lugares merecidos no pódio da vida, conhece os valores morais e espirituais, nunca esquece o respeito aos seus semelhantes, não é capaz de assaltar, roubar ou matar. Repudia a lei do mais forte do olho por olho dente por dente e do salve-se quem poder.
Observando a vida pela ótica do Fernandes Anaia é possível acreditar que o Mundo tem jeito. Pode parecer impossível corrigir o que já foi feito de errado, mas não é, nem tudo está perdido, o mundo está cheio de gente que “não presta”, foi assim no passado continua no presente e continuará no futuro. Pessoas que não prestam talvez não mereçam muita atenção de nossa parte porque não devemos segui-las, mas é bom conhece-las para não repetir seus erros.
Aqui neste plano já passaram muitas pessoas de boa índole que nos deixaram seus legados e se projetaram socialmente através de suas mensagens e pela luta e coragem com que se esforçaram para tornar este mundo melhor e mais justo.
Retroagindo no tempo encontramos inúmeras destas pessoas boas dentre as quais vale destacar: Mahatma Gandhi, líder pacifista indiano idealizador e defensor do princípio de não agressão, libertou a Índia do domínio inglês sem disparar um único tiro, Martin Luther King, pastor protestante, destacou-se na luta pelos direitos para negros e mulheres nos Estados Unidos da América, Nelson Mandela, grande líder politico da África do Sul, Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes a Irmã Dulce brasileira do Estado da Bahia, mulher de estatura física pequenina e frágil uma lutadora incansável pela defesa dos fracos e necessitados. São pessoas por quem podemos nos guiar pelo exemplo de grandeza e ações pela construção da paz em todos os sentidos.
Gandhi, Martin Luther King, Mandela e Irmã Dulce já foram para outra dimensão, mas certamente o mundo também continua repleto de pessoas boas. Não será necessário irmos para a Bahia, Estados Unidos, África do Sul nem para a Índia para encontrarmos pessoas espirituosas basta prestarmos a atenção nas pessoas próximas de nós porque indivíduos assim estão bem perto, mas nos habituamos prestar atenção nas pessoas de destaque social e esquecemo-nos de procura-las na nossa comunidade entre as pessoas comuns.
Na comunidade, no meio das pessoas comuns existe muita gente boa, pessoas do bem que agem pelo amor ao próximo são capazes de estender a mão àqueles que precisam de auxilio sem vislumbrar recompensa, pessoas que não traem, não trapaceiam e sentem as dores dos seus semelhantes porque tem Deus no coração.
Sim, existem pessoas que tem Deus no coração e elas estão por todo lugar, uns trabalhando intensamente e se projetando socialmente outras agindo de forma modesta no seio de suas famílias zelando pela criação de seus filhos, formando cidadãos de bem, mostrando a importância do lar no contexto social, dando bons exemplos na sua comunidade, gente de bem com seus vizinhos com o seu bairro vila ou cidade sem invadir a privacidade de ninguém, respeitando idosos e crianças.
É importante lembrar que o Mundo também é feito pelas pessoas simples. Às vezes ou quase sempre as pessoas virtuosas estão vestidas de simplicidade fazendo sua parte nesta construção sem chamarem para si gloria ou fama. Simplesmente fazendo sua parte.
Simplesmente fazendo a nossa parte é possível transformar esta Terra no lugar ideal para sermos felizes.
Já vimos que a sociedade está repleta de pessoas boas só precisando ser ouvidas e levadas a sério por nos, seres ainda incapazes de sermos aplicados na “unidade pela paz”. (Carta de Paulo aos Efésios 3).
Os pessimistas dizem que a vida é complicada, não é bem assim, o homem é quem faz a vida complicada, um dia desses seremos capazes de abrir os olhos e acreditar “sermos pouco menos que um anjo”; aí então, para o nosso próprio bem decidiremos fazer as coisas corretas como é pra fazer. Quando alcançarmos este estágio, com certeza também teremos atingido o grau de capacidade de agir como fez o maratonista Fernandes Anaia, cada um sem distinção de religião, nacionalidade, cor, raça ou posição social e econômica entenderá que este mundo foi criado para o ser humano ser feliz e que o homem tem a responsabilidade de construir esta felicidade fazendo da terra um lugar de paz um lugar bom para viver.
O homem está falhando nesta missão por isso faz-se necessário uma tomada de decisão para o mundo caminhar rumo à construção da felicidade. Não adianta esperar que a Natureza (Deus) venha construir esta felicidade, esta construção é de responsabilidade do homem então só o homem pode fazer.
O mundo um dia será melhor, mas, para isto acontecer o homem precisa decidir corrigir os rumos buscar e ocupar seu lugar merecido no pódio com dignidade e mérito sem precisar envergonhar a ninguém sem medo de se envergonhar de alguma coisa que fez no passado.
Se isto será fácil ou difícil depende de cada um. Mas sem sombra de dúvida é preciso combatendo o bom combate. Só assim o homem construirá um céu aqui na Terra, subirá ao pódio merecido com dignidade, cada um expondo sua medalha com o mesmo sabor, mérito e dignidade como faz o maratonista Fernandes Anaia segundo lugar (medalha de prata) na maratona de 2012 na Espanha.
A vida não é uma maratona é uma oportunidade e esse mundo tem jeito só depende de nos.
Manaus-AM, 28 de setembro de 2016.
*Sebastião do Monte Souza , é cruzeirense, nascido na então vila Japiim (Mâncio Lima), servidor público Federal aposentado