O cangaço tinha demandas sociais e uma relação com a população, que muitas vezes os acobertavam. No modo atual, a população só sai prejudicada. O único gesto favorável à população nesse tipo de crime foi visto em Criciúma, quando os bandidos deixaram um malote de dinheiro nas ruas. O movimento serviu para atrapalhar o trabalho dos policiais e causar tumulto.
Outra característica do roubo em Araçatuba é a sofisticação das técnicas e o aumento da sensação de terror. Nos anos 2000, grandes assaltos eram realizados a partir de abordagens mais silenciosas e que evitavam o confronto. As ações consistiam no sequestro das famílias dos gerentes e tesoureiros das instituições financeiras. As quadrilhas entravam nas agências antes da abertura para o atendimento ao público e sacavam todo o dinheiro.
A partir disso, os bancos passaram a adotar uma série de medidas como o treinamento de seus seguranças e a formulação de ações estratégicas. Hoje, os cofres só abrem em determinado horário, que varia a cada dia. Por isso, os criminosos só conseguem acessar o dinheiro usando explosivos. Ficou mais difícil realizar assaltos com abordagens mais discretas e até burlescas como as das décadas de 1990 e 2000.
No roubo desta segunda-feira, foram usadas técnicas que causam terror e prejuízos materiais e psicológicos ao município e aos moradores. Eles transformaram a cidade em uma espécie de campo minado. É uma evolução tecnológica que busca, sobretudo, evitar a chegada da polícia. Um crime visivelmente planejado a cada passo, por pessoas que têm visão estratégica, e que vai se aperfeiçoando a cada nova ocorrência.
Além da distribuição de explosivos pela cidade, outra novidade desse ataque foi o uso de reféns como escudo no capô dos carros e não apenas em volta dos bandidos ou dentro dos veículos. Isso foi feito para evitar os disparos que poderiam vir de prédios ou de helicópteros. A estratégia do escudo humano passa a ser tridimensional.
Não podemos afirmar que essas características vão se manter em ocorrências futuras, mas percebemos que o contexto e o local de uso dos explosivos têm se estendido cada vez mais. Os assaltos estão se tornando cada vez mais arriscados e potencialmente letais aos habitantes da cidade. E se mostra cada vez menos recomendável a interferência e a reação imediata da polícia ou de civis armados.
*Antropóloga, professora da Universidade Federal do Ceará e pesquisadora do Novo Cangaço