Cruzeiro do Sul, Acre, 22 de dezembro de 2024 17:36

Benigna Correia: Memórias de uma matriarca centenária de Cruzeiro do Sul

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A nossa matriarca Benigna Correia da Silva nasceu em 22 de fevereiro de 1921, na Vila Humaitá, atual cidade de Porto Valter, naquele período um pequeno vilarejo situado à margem do Alto Rio Juruá.

Filha de nordestinos, pai cearense e a mãe potiguar, sendo eles o Sr. Manoel Correia da Silva e a Sra. Maria Nazaré Rodrigues, ambos migrantes que a exemplo de tantos outros trabalhadores brasileiros e estrangeiros, para cá vieram, no auge do ciclo da borracha com o propósito de atuar na extração do látex, o ouro negro da Amazônia e ter acesso às riquezas produzidas a partir dessa valiosa matéria prima.

Dona Benigna: Ensaio fotográfico no aniversário de 100 anos na varanda de sua casa

Casou com o seringalista Antônio Cardoso da Silva em 1940, aos 19 anos de idade. Dessa união nasceram 13 filhos: Angenor, Maria Geny, Toinho (Antonio Filho), Nazaré, Neca (Júlia) Jorge, Antenor (Cardosinho), Glória, Conceição, Pedro e Paulo (Gêmeos), Clóvis e Cesar. Sendo 47 netos; 69 bisnetos e 14 tataranetos, identificados até o presente momento. É possível que esses números possam ser atualizados. Hehehe!

Após o matrimônio o jovem casal permaneceu por alguns anos em Humaitá. Desta localidade seguiram para Grajaú, mas nesse lugar estiveram por pouco tempo. Dali seguiram adiante e o destino foi a localidade denominada Porongaba. Nesse período Antônio Cardoso atuou na exploração dos seringais Ocidente e Triunfo (arrendado do Sr. Agamedes) enquanto Benigna atuava como professora no citado lugar denominado Porongaba, lecionando para os seus filhos e algumas crianças da comunidade, na Escola Mário Lobão. Anos depois o casal decidiu transferir-se para a cidade de Cruzeiro do Sul onde se instalou definitivamente. Ele até sua morte, em 1975, em decorrência de problemas renais, e ela até o presente momento.

Homenagem de filhos, netos, bisnetos, tataranetos: “Somos gratos a Deus por tê-la feito nossa matriarca”

Depois de se instalar em Cruzeiro do Sul, em meados de 1970, Benigna se manteve na função de educadora na Escola Craveiro Costa, antigo Ginásio. Viúva aos 54 anos fez da sua afinidade com a educação uma constante e necessária profissão garantidora da sua sobrevivência e dos seus filhos ainda menores. Sendo que após o falecimento do esposo a matriarca da família Silva não mais casou e desde então seguiu trabalhando e garantindo o sustento da sua prole.  Sozinha cuidou de todos com o esmero e a obstinação de uma mulher guerreira e de fibra que precisou se desdobrar para superar as adversidades que lhe foram impostas e suprir as necessidades elementares dos seus dependentes, partilhando com estes os bons momentos, aqueles de dificuldades e perrengues sem, contudo, perder a dignidade e a decência.

O evento da aposentadoria Dona Benigna (como era popularmente conhecida) não fez com que ela se acomodasse. Detentora de um espírito altivo e empreendedor decidiu dedicar-se ao comércio. Assumiu a gestão dos boxes no Mercado Público Municipal (espaços popularmente chamados de quartos) onde atuou na venda de secos e molhados (estivas) por longos anos. Através do seu esforço e determinação a mesma qualificou a renda familiar. Contudo, após décadas de atuação veio o momento da difícil decisão de parar. Os boxes onde funcionava o pequeno comércio foram vendidos e a partir de então o trabalho e a obrigação abriram caminho para as viagens e o lazer merecido ao lado de seus familiares. Afinal, era tempo de iniciar uma nova fase da sua vida, um novo ciclo, de percorrer longos trechos entre cidades e aeroportos, passando temporadas aqui e outras lá, com os filhos e filhas, nos diferentes lugares do Estado e do País, onde sua vontade lhe pedisse pra ficar.

Falando assim parece que tudo foi rápido. Mas não foi. Basta ver que são 100 anos de uma bela história. A questão é que estamos falando de 100 anos. Um desafio cujo tempo privilegia poucos seres humanos dentre nós. O bom é que podemos dizer foi uma trajetória cujo legado de memórias, ensinamentos e posturas, para nós, familiares, e para a cidade que ela escolheu para percorrer sua existência plena, que é sem dúvida, o maior legado que essa mulher, sinônimo de fibra e dignidade, poderia nos deixar.

Celebrar os seus iluminados 100 anos de vida, de história e de tantas memórias é o nosso mais indescritível e ao mesmo tempo singelo presente. É uma experiência e\ou momento único e oportuno no qual lhe agradecemos por ser a referência humana para diferentes gerações da nossa família e por nos honrar como um exemplo singular de pessoa, mãe, avó, bisavó e tataravó. Bem como por exercer o duplo papel de pai e mãe, pois embora em algumas ocasiões tenha sido dura e até áspera, como um pai, em outros momentos foi terna e afável como toda mãe o é. Hoje sabemos que fez a coisa certa.

Foram esses adjetivos que a qualificaram como uma mulher diferente, única e centenária. Por isso, hoje, o que mais gostaríamos é que esta data fosse comemorada por todos com muita alegria, euforia e uma ‘chuva de amor’ e de bênçãos. No entanto, o difícil, ultrajante e trágico momento de crise sanitária e de avassaladores impactos naturais, infelizmente exigiu a suspensão de tudo que planejamos e gostaríamos de realizar. Nossos planos compreendiam a realização de uma belíssima e inesquecível festa na qual reuniríamos todos os filhos, netos, bisnetos e tataranetos. Porém, essa imposição do destino ou os desígnios supremos interferiram diretamente nos nossos planos e transformaram nosso sonho em mera expectativa e saudade nostálgica uma vez que não podemos estar presentes e realizar a mais expressiva confraternização da história dos ‘Correia da Silva’.

Mesmo assim, embora estejamos distantes material e fisicamente, seguiremos juntos e fortes, seja pelos laços de sangue e de fraternidade ou pelo sublime sentimento de carinho e afeto familiar que nos une.

Sabemos que as poucas linhas aqui tracejadas não dão conta nem são capazes de retratar uma trajetória histórica tão emblemática como a sua, nem de expressar a grandeza humana diante dos ‘seus’ e da sociedade cruzeirense. Saiba, todavia! Mesmo assim as poucas palavras ditas revelam a essência de todo sentimento possível de existir em nossos corações.  Assim sendo podemos dizer que a senhora, Vó Benigna Correia, é uma figura mais que especial, é o nosso pilar, a base essencial da nossa família e um presente enviado do céu para iluminar nossas vidas.

Encerramos destacando que o que existe de mais bonito no seu centésimo aniversário, não é o tempo decorrido, mas a quantidade de vida que há em você e em toda sua trajetória exemplar. E isso certamente se deu porque em tudo que você fez plantou amor, carinho e dedicação.

Que essa trajetória incrível de vida seja recordada, por toda nossa existência e por tantas outras gerações da nossa família.

Somos gratos a Deus por tê-la feito nossa matriarca.

Parabéns. Feliz 100 anos de existência.