Cruzeiro do Sul, Acre, 15 de março de 2025 04:26

Entrevista: Dra. Cíntia Sampaio – “Amo essa profissão e decidi ficar em Cruzeiro do Sul, além da família pelo carinho da população”, diz a profissional ao parabenizar os colegas pelo Dia do Psicólogo quando comemora 25 anos de profissão

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A Psicóloga, Dra. Cintia Sampaio, especializada em Neuropsicologia, mora em Cruzeiro do Sul há 18 anos, onde exerce a profissão como servidora pública concursada do Estado e do Município, concedeu entrevista ao Voz do Norte onde destaca a importância da profissão, sua satisfação de comemorar 25 anos de graduação pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) e aborda diversos aspectos da profissão que ganhou ainda mais importância na pandemia.

Vozdonorte – Qual a importância dessa profissão?

Dra. Cíntia Sampaio – É com orgulho que digo que o psicólogo que é um profissional que trabalha com amor, é preciso ter amor e o dom, mas ele não é um conselheiro, ele é um auxiliar que pode ajudar o ser humano a descobrir o que está acontecendo no seu comportamento, nas suas emoções, o que a pessoa está sentindo diante de situações, traumas, momento que o psicólogo entra em ação para descobrir as causas do momento ou até do passado, no caso do psicólogo clínico.

O psicólogo no geral acaba vendo como a pessoa se comporta no aspecto profissional e pessoal sendo que todas as áreas da psicologia são importantes, psicologia do trabalho, psicologia social, do esporte, como por exemplo, o psicólogo que avalia a saúde mental do atleta para ter um bom desempenho. Recentemente vimos uma ginasta, atleta da equipe americana nas olimpíadas de Tókio, que foi afastada devida sua saúde mental.

Vozdonorte – Sua avaliação do trabalho da psicologia no nosso município…

Dra. Cíntia Sampaio – Em Cruzeiro do Sul estamos num momento de mudança de visão da sociedade que avaliava que o psicólogo como um profissional que trabalhava apenas com pessoas considerados como “doido”, mas não é isso, é uma profissão maravilhosa que lida realmente com a alma da pessoa, que não vai mudar a pessoa, mas vai trazer estratégias e ferramentas para que a pessoa possa perceber o quanto ela pensa e acredita e isto também afeta ou a faz melhorar.

A maioria das pessoas já percebeu que o psicólogo tem sua importância na vida das pessoas.
Nestes 25 anos de profissão tenho visto muitas pessoas depressivas que tem tido bons resultados com terapias, além de atividades físicas, buscaram tratamento com médicos e procuraram o psicólogo para a terapia. Todos pacientes que procuram o profissional quando se esforçam percebem o quanto é bom e que ele consegue muitas melhoras com a dedicação. Existem várias áreas de abordagem que funcionam muito bem.

Tem psicólogo que trabalha como psicanalista, comportamental, que atuam em outras abordagens como a Yungana, Lacaniana, Positiva, entre outras, e todas apresentam um bom resultado. É importante frisar que o psicólogo precisa amar o que ele faz para que o trabalho tenha um resultado de excelência. Muitas vezes nos deparamos com clientelas que vem até nós com sofrimentos psicológicos decorrentes de traumas, abusos, bullying e violência doméstica.

Vozdonorte – E como funciona esse relacionamento com o paciente?

Dra. Cíntia Sampaio – A pessoa chega e vamos arrumar um pouco aquela bagunça mental da cabeça dela que não vai voltar a ser o que ela era antes, mas poderá mudar para melhor. Se ela estava num estado nervoso, ansioso e de depressão quando ela faz terapia ela não pode se prender ao passado, ela não vai esquecer os problemas, mas precisa superar e saber como enfrentar. Não nos livramos de traumas, mas precisamos a aprender a superar. Existe o vínculo entre psicólogo e paciente.

Voz do Norte – Há cerca de 15 anos a senhora concedeu uma entrevista que abordou o tema depressão como um dos males do mundo. Como está esse conceito atualmente?

Dra. Cíntia Sampaio – Atualmente se vive um momento muito diferente. Lembro da entrevista, ainda tenho o jornal guardado, mas mudaram muitas coisas inclusive na questão de medicações novas, na forma de agir, muitos estudos novos e o psicólogo precisa se aprimorar e se aperfeiçoar para trabalhar com as pessoas que precisam de ajuda.

Neste momento dessa pandemia, em 2021, estamos numa nova era com uma repercussão social e emocional muito grande que afeta todas as pessoas que estão vivendo o problema. Depressão por causa de pessoas que perderam seus parentes pela Covid, pelo medo de como vai ser o futuro, ansiedade e muitas pessoas ficam preocupadas com o que vai acontecer no futuro. Em relação a pandemia, a procura por profissionais da psicologia aumentou em 80%.

Mas, na realidade, daquele tempo para cá aumentou muito os casos de depressão e a procura por atendimento é muito maior, tem um grande número de pacientes com depressão pela pandemia, mas o município tem um grande número de profissionais psicólogos de muita qualidade que podem apoiar a população nesse momento. Isso é um grande avanço e a internet que tem seus lados positivo que tem ajudado muito as pessoas que podem fazer até uma consulta médica e psicoterapia on line com o cliente na tranquilidade e conforto da sua casa.

Vozdonorte – Terapia on line, então, é mais uma novidade?

Dra. Cíntia Sampaio – Com certeza, existem pessoas que me procuraram que moram no Paraguai e no Rio Grande do Sul, eu indiquei aos meus colegas pessoas que estavam precisando de apoio. Com a internet em tempo real as pessoas passaram a ter mais conhecimentos. É possível pegar uma receita on line, eu mesmo faço a terapia com o cliente em casa. A pessoa paga e o atendimento on line é realizado. Atualmente está muito mais fácil com o acesso pela internet, mas na realidade aumentou muito o número de pacientes, inclusive os que tem vontade de cometer o suicídio.

Vozdonorte – Esse assunto, suicídio, que não abordamos nas nossas matérias, então, precisa ser abordado como orientação?

Dra. Cíntia Sampaio – A questão do suicídio é muito problemática no mundo e no Brasil pelo trauma que deixa e se trata de uma realidade que tem aumentado. Todos os dias muitas pessoas se matam porque não aguentam a pressão, empresários motivados que tinham um padrão elevado de vida financeira e vão a falência despencam porque o ser humano tem uma motivação apenas para crescer e se ela não tiver uma rede de apoio a tendência é se isolar. Entram em depressão profunda e podem começar a ter ideias suicidas.

Neste momento é importante a rede de apoio e a presença da família para acompanhar porque normalmente a pessoa fica isolada, deixa de tomar banho, está muito triste, deixou de fazer as atividades que gostava e as vezes tem muita gente que ainda entende que quem quer se matar não avisa, mas na verdade a pessoa dá muitos sinais e um deles é a tristeza, depressão, baixa autoestima e irritabilidade. Muitos postam em suas redes sociais mensagens que caracteriza a depressão e a vontade de morrer.

Quando a pessoa pensa que a vida não tem mais valor ela se não tiver um controle começa a fazer um planejamento mental e não vai falar para ninguém. Palavras como:”gostaria que Deus me levasse”, “a vida não tem mais sentido”, “para que viver?” São sinais que precisam ser percebidos, então é preciso agir imediatamente porque muitos familiares mandam a pessoa buscar igrejas, espiritismo, fé, ou que é uma frescura e a pessoa está querendo chamar atenção são sintomas muito recorrentes do suicídio.

Vozdonorte – Qual o remédio para evitar os suicídios? Como a senhora orienta as famílias.

Dra. Cíntia Sampaio – Buscar ajuda é o melhor remédio para prevenir. Temos vários tipos de ajuda como a médica, psicológica, familiar, esporte, lazer, espiritualidade independente da religião: católica, evangélica, candomblé, daimistas. É importante a criação de uma rede de apoio que podem ser feitas inclusive com grupos via whatsapp para monitorar a pessoa, com familiares e amigos da pessoa que tem ideações suicidas, essa tem o direito de saber da criação desse grupo, para que as pessoas possam cuidar e acompanhar os passos dela.

Quando a família se omite e começa a fazer acusações de falta de fé, falta do que fazer, querendo empurrar a bíblia ou outras atividades não devem proceder assim. É preciso amar a pessoa, ouvir a pessoa para saber o que ela está sentindo, fazer um acolhimento e segurar na mão da pessoa. O Amor e a confiança é um processo de cura muito importante e se não segurar na mão ela pode soltar e até tirar sua própria vida. A família precisa entrar no processo de tratamento.

Vozdonorte – As famílias são tidas como a base da sociedade, mas nos últimos tempos há muitas separações e desagregação com o abandono dos filhos…

Dra. Cíntia Sampaio – A formação de uma família, muitas vezes através de escolhas precipitadas, sem conhecer melhor a outra pessoa, muitas vezes o casal já vem de uma família desestruturada, que não tem base firme, afinidade entre os pais, as crianças não tem limites, muitas vezes os pais disciplinam com raiva, falta diálogo e amor e para conversar é preciso achar uma hora que não seja o da novela e do futebol.

Aquela hora do almoço, que deveria ser um momento de paz, de risadas não tem mais acontecido, um almoça no quarto, outro na frente da televisão e os valores se perdem. A pessoa pede para cuidar do filho que não sai do quarto e não larga o celular, mas quando a criança sai para a sala encontra o pai e a mãe ocupados também usando o celular ou assistindo a novela. É um cenário muito comum nos dias atuais e quando a criança forma sua família vai repetir o exemplo.

A família se ela não tiver estruturada pode causar muitos traumas, as filhas querem casar logo para poder sair de casa, os filhos acabam tendo outras escolhas, encontrar amigos nos bares, drogas, festas e traficantes e as vezes acontecem acidentes e incidentes que causam muitos sofrimentos e dor. Muitas vezes acontecem abusos e xingamentos desnecessários e tudo isso contribui para destruir a paz nos lares e muitos problemas mais sérios.

Vozdonorte – A violência doméstica precisa ser banida dos lares brasileiros, como a senhora avalia essa situação crítica das famílias?

Dra. Cíntia Sampaio – A questão da violência é uma séria preocupação inclusive pelo alto número de feminicídios e agressões. A mulher não deve se sujeitar ou aceitar a violência logo na primeira vez, que normalmente é um xingamento ou violência moral e precisa enxergar que ela é capaz, que terá pessoas que vão lhe apoiar e não se submeter de maneira nenhuma a um relacionamento abusivo.

Muitas mulheres se submetem a violência porque não tem trabalho e o homem é o provedor da família, mas não deve conviver com uma pessoa que é capaz de xingar, bater e até a ameaçar de morte. Quando ocorrer essa situação é preciso haver uma decisão drástica até de denúncia porque quem ameaça pode matar, como acontece em muitos casos.

A carência que se teve na família com pai e mãe é um sério problemas, as vezes namora um mês e coloca uma pessoa que não conhece dentro de casa, entra numa relação abusiva, tóxica, a mulher diz que ama o marido, mas diariamente sofre agressões de todos os tipos e pergunto que amor é esse?

Então é preciso essa reflexão porque a segurança da mulher envolve ainda os filhos que ficam órfãos quando o marido mata. Mas, o agressor também é um doente e precisa de tratamento, mas não adianta correr riscos de conviver com uma pessoa que agride porque a mulher merece ser amada, cuidada e regada de amor, como o homem e enfim, é preciso ter paz para que a família seja a verdadeira base dos seus filhos.

Há cerca de 20 anos a Dra. Cíntia Sampaio conheceu o esposo, Rosito, numa viagem que ele fez a Londrina e dois anos depois se casaram e ela veio morar em Cruzeiro do Sul onde fixou residência e se realiza profissionalmente.

“Sou realizada e muito abençoada e gosto muito de morar em Cruzeiro do Sul. Aqui no Acre sou concursada do Estado e do município. Tenho muito honra do meu trabalho e há muito tempo já atuo na Maternidade e no Creas com vítimas da violência sexual – crianças, jovens, homossexuais, idosos e na maternidade com mulheres com depressão pós-parto, que perdem o bebê ou que descobrem que tem câncer e precisam de apoio”, disse.

Um detalhe contado pela Dra. Cintia é que além da sua família o carinho da população e que a fez ficar definitivamente em Cruzeiro do Sul. “É um povo humilde, carinhoso e em Cruzeiro do Sul temos uma boa estrutura de trabalho para atender uma demanda, apesar do aumento muito grande de denúncias, que tem inclusive uma participação muito boa dos profissionais da comunicação, que faz com que as pessoas percebam que podem ser amparadas e apoiadas”, avalia.