Cruzeiro do Sul, Acre, 22 de novembro de 2024 04:31

Artigo – Os efeitos da crise climática na saúde acendem novo alerta – Marcellus Campêlo

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O impacto da crise climática sobre o meio ambiente é tema recorrente nos noticiários e tem servido de combustível para pesquisas e estudos científicos que apontam um cenário nada animador. A novidade mais recente, que engrossa esse caldo de catástrofe iminente, é a correlação entre os efeitos climáticos e a saúde humana. Mais um sinal vermelho que se acende no radar, um dado de extrema relevância para todos.

O alerta nesse sentido vem de dois estudos divulgados recentemente: os relatórios publicados pelo Fórum Econômico Mundial e pelo Lancet Countdown. O relatório do Fórum foi elaborado em parceria com a consultoria Oliver Wyman. O estudo, inédito, avaliou seis grandes categorias de eventos do clima e seus reflexos na desnutrição e poluição do ar. Constatou que o aquecimento global e os eventos climáticos extremos estão provocando maior incidência e propagação de doenças no mundo, algo que ainda não havia sido mensurado.

A previsão, conforme o estudo, é de mais de 14,5 milhões de morte, até 2050. Entre os seis riscos climáticos analisados, as inundações são as mais preocupantes, porque podem ocasionar a morte de 8,5 milhões de pessoas. A seca vem logo a seguir, com previsão de provocar 3,2 milhões de mortes.

O impacto da crise climática sobre os sistemas públicos e privados de saúde já é grande, sobrecarregando-os a patamares críticos. O estudo aponta que o custo extra para os sistemas de saúde deve alcançar a cifra de US$ 1,1 bilhão.

Ressalta, ainda, que a crise climática deve provocar o deslocamento de milhões de pessoas, em função da falta de água potável ou das inundações e secas. E impor perdas econômicas adicionais de US$ 12,5 trilhões no PIB mundial, por improdutividade e invalidez.

Na mesma linha de preocupação segue o 9º Relatório Lancet Countdown sobre saúde e crise climática. O documento é resultado de colaboração internacional de pesquisa, reunindo 122 especialistas de 57 instituições acadêmicas.

O documento apresenta dados indicando que a população mundial enfrenta ameaças sem precedentes à saúde, devido ao aprofundamento da crise climática no mundo. A queima de combustíveis fosseis, principal causador do efeito estufa, também traz consequências letais à saúde. Outro dado preocupante é que o calor excessivo provoca o aumento da área onde os mosquitos circulam, o que faz crescer a incidência de doenças provocadas por eles. É o caso da dengue, transmitida pelo mosquito aedes aegypti, com incidência 11% maior do que na última década, por causa da alta temperatura.

Este é o pior cenário já traçado, desde que o grupo iniciou esse trabalho, há oito anos. O Lancet Countdown monitora 15 indicadores de ameaças à saúde e 10 deles, conforme o estudo, apresentaram recordes em 2023.

Também alçaram recorde as mortes relacionadas a calor, insegurança alimentar e propagação de doenças infecciosas, causadas pelos eventos extremos relacionados à crise climática, na comparação do período de 2014-2023 com a década de 1990. Os idosos foram os mais atingidos. As mortes relacionadas ao calor aumentaram 167% em pessoas com mais de 65 anos, nesse período.

De um modo geral, os efeitos da crise climática são mais sentidos, sempre, nas populações vulneráveis. Além dos idosos, mulheres, indígenas, jovens, idosos, grupos de baixa renda e comunidades remotas.

O estudo destaca, ainda, que 512 bilhões de horas de trabalho foram perdidas devido ao forte calor, em 2023. O Brasil ganha destaque especial nesse item, como um dos países mais afetados, e especialmente no setor agrícola, onde há muita exposição ao calor na execução de atividades ao ar livre.

O apelo dos cientistas, em todos os trabalhos e estudos que vêm sendo regularmente realizados, é para a urgência na implantação de ações mitigadoras dos efeitos climáticos, de forma a reduzir as emissões de gases de efeito estufa na atmosfera. Isso implica numa conscientização geral, mas em especial das indústrias, cada um fazendo a parte que lhe cabe.
Serão necessários, também, investimentos pesados em tecnologias para redução das consequências do calor extremo à saúde da população e em novas vacinas e tratamentos médicos.
Os cientistas já consideram que não se conseguirá mais limitar o aumento das temperaturas a 1,5 °C, como estabelecido pelo Acordo de Paris. O cenário mais realístico, para o qual deveremos estar preparados, é de ficar entre 2,5 e 2,7 °C, com os efeitos devastadores já fartamente divulgados.
O assunto, com certeza, deverá ser tratado na Conferência do Clima, a COP 30, que ocorrerá no próximo ano, em Belém, de onde deverá sair a indicação de políticas públicas que permitam dar uma resposta global e mais urgente a esses desafios e com o apoio forte dos países mais ricos. O Amazonas estará lá, participando, dando a sua contribuição e mostrando que temos combatido esses efeitos como podemos, mas que é preciso um esforço conjunto, porque não se trata de um problema local, mas de ordem global.

*Marcellus Campêlo é engenheiro civil, especialista em Saneamento Básico e em Governança e Inovação Pública; exerce, atualmente, os cargos de secretário de Estado de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano – Sedurb e da Unidade Gestora de Projetos Especiais – UGPE